Pantanal MS
19 de Setembro / 2024

A jovem mãe Evelyn e seu marido - antes da tragédia familiar / Vista da Maternidade da Santa Casa de Corumbá. | Créditos: Redes sociais / MS Diário

  • Publicado em: 16 de Janeiro, 2024 | Fonte: Fábio Marchi

Corumbá - A gravidez é um dos momentos mais delicados para as mulheres que optaram por serem mães - e também um dos períodos de maior risco para a vida dessas mulheres, como para seus bebês.

Em Corumbá, infelizmente mais um bebê entrou para as estatística de mortalidade infantil da cidade - e os parentes da jovem mãe adolescente Evelyn Lara Malheiros (17) fazem vários questionamentos sobre o aconteceu no fatídico dia 13 (sábado), quando uma série de eventos culminaram com o a morte de Luiz Lorenzo, um saudável bebê de 3,250 kg.

Segundo a sogra de Evelyn, Glaucilene Coimbra (41) - que acompanhou praticamente todos os acontecimentos que envolveram sua nora - Evelyn estava sentindo fortes dores e reclamou para seu marido Luis Ricardo Coimbra (20) sobre isso às 10:00h da manhã de sábado, por telefone.

“Quando consegui falar com ela, ela pediu absorvente - aí eu pensei “Meu Deus!”, porque isso não é normal em uma gravidez, né? Daí na mesma hora eu saí do serviço, era 11 horas da manhã e eu fui lá em casa ver ela e quando eu cheguei, meu filho já estava lá - então corremos com ela para a maternidade, porque ela estava sangrando.”

O jovem casal aguardava Luiz Lorenzo com ansiedade, pois já tem uma menina. | Créditos: Redes sociais / Facebook

ISSO NÃO É NORMAL

O pré-natal que Evelyn fez no Sistema de Saúde Municipal, apontava que a jovem estaria grávida de 8 meses - e portando, segundo a avaliação médica da gestante, o bebê ainda seria “prematuro”. Glaucilene conta que chegaram na Maternidade da Santa Casa de Corumbá por volta das 11:30h da manhã, onde recebeu os primeiros atendimentos.

“A médica plantonista examinou ela, falou que não estava na hora. Daí ela pegou e fez um toque nela, falou que não estava na hora, que aquilo dali era apenas uma dor - e mais tarde ficamos sabendo que era dor de contração. Aí a médica disse que ia passar uma medicação para ela, para diminuir a dor. E fez, a dor diminuir um pouco e ela saiu de lá às 13:30h da tarde.”

De acordo com Glaucilene - que também é mãe de dois filhos - esse evento a deixou muito preocupada, porque segundo ela, “isso não era normal”:

“Isso nunca aconteceu comigo, aliás, é a primeira vez que eu vejo isso acontecendo na nossa família, né? Então por isso eu acho que isso deixou a gente meio desorientada, porque não é normal sair sangue e sentir dor assim, ali a gente ficou desconfiada que alguma coisa de errado estava acontecendo”.

Glaucilene disse para a médica pra afazeres logo uma cesárea, porque Evelyn já era mãe de uma menina, que nasceu através desse tipo de cirurgia, mas a médica disse que ia tentar segurar “mais um tempo, até completar os nove meses, porque o bebê estaria prematuro”.

“Ela disse que por ser prematuro, aqui nós não temos unidade de neonatal, não temos UTI para bebês. Então disse que iria fazer de tudo para segurar o bebê, senão teria que ter o bebê em Campo Grande, porque aqui não haveria condições de o bebê nascer prematuro”.

TRABALHO DE PARTO?

A sogra de Evelyn também questionou se a jovem não estaria em trabalho de parto, ao que a médica plantonista respondeu:

“Não, ela não está em trabalho de parto, o sangramento é apenas algum esforço que ela fez e sangrou”. Isso ela disse para mim, então eu só tive que aceitar, né? Ela é a médica, né?

Evelyn ficou um tempo em repouso e logo no início da tarde, foi liberada para ir embora, ao que a sogra e seu marido estranharam a liberação, porque segundo eles, a adolescente ainda sentia dores, não tão intensas, mas ainda sentia. Segundo seus familiares, a médica havia receitado “Buscopan”- um conhecido medicamento utilizado para dores abdominais, ao que Evelyn tomou, mas as dores foram aumentando de intensidade, com o passar do tempo. Então os familiares levaram a jovem novamente para a maternidade, por volta das 19:30h da noite de sábado:

“Nós chegamos e demos entrada na Maternidade e minha nora ficava lá gemendo alto: Tô com dor! Tô com dor! E a gente pediu pra ser atendido pela médica plantonista e ela demorou bastante pra aparecer. A recepcionista teve que chamar duas vezes e disse: “ela já está ciente que precisa vir”. E era a mesma médica que havia atendido a gente à tarde e deu a impressão que ela não queira atender a gente. Passou uma hora, já eram nove horas da noite, quando ela apareceu, mas ficou só olhando. Quem fez todos os procedimentos foi uma enfermeira, que disse que ela tinha 8cm de dilatação, ela estava em trabalho de parto!”

Fachada da Maternidade da Santa Casa de Corumbá | Créditos: Fábio Marchi / MS Diário

INSISTÊNCIA

Glaucilene mais uma vez insistiu que deveriam fazer uma cesariana na jovem, porque a outra gravidez ela precisou de uma cesariana para a bebê dela nascer - e a médica então teria dito que “nenhuma gravidez é igual à outra” e que tentariam então induzir o parto normal.

Evelyn então foi conduzida para o interior da Maternidade, para ser internada enquanto sua sogra preparava os papéis da sua internação. Depois ela foi ver a nora, que continuava reclamando da dor, mas não era uma “dor que ia e vinha”, que segundo ela não parecia ser dor de contrações, mas uma dor intensa e constante, que aumentava com o passar do tempo.

Segundo os familiares de Evelyn, após algum tempo nessa agonia, chegou uma segunda médica, que avaliou novamente a jovem mãe - e após auscultar o bebê, disse que teriam que fazer uma cirurgia urgente.

“Quando a outra médica colocou o estetoscópio na barriga dela, a expressão dela mudou na hora, ela levantou rápido e disse que iria fazer a cirurgia naquele momento - e já falou para o pessoal levar ela para o centro cirúrgico. Daí já vieram correndo, trouxeram uma cadeira, colocaram ela na cadeira e levaram ela pra cirurgia.”

DEMORA DO ANESTESISTA

A sogra de Evelyn conta que depois de toda essa agonia, de correr para o centro cirúrgico, ainda tiveram que esperar por quase uma hora a presença do anestesista - que não se encontrava na maternidade.

“Ele chegou bravo, mas não entendi o que ele dizia - só sei que depois o pessoal falou que se demorasse mais um minuto, nós teríamos perdido o bebê e ela, também. Minha nora estava com hemorragia, e pior, a anestesia não pegou direito. Quando a médica fez o corte, ela deu um urro de dor! Até eu gritei junto, porque estava lá, com ela, na sala de parto.”

Evelyn, já na Maternidade, sentindo dor e impaciente - na noite de sábado. | Créditos: Arquivo da Família

BEBÊ NASCEU MORTO

O bebê, que deveria se chamar Luiz Lorenzo nasceu com 3,250 kg - porém, sem vida. Os familiares se revoltaram com a situação, porque segundo eles, Evelyn não recebeu a atenção médica adequada e também porque a médica plantonista parecia que “não sabia o que estava fazendo”:

“Deu a impressão que a médica não sabia o que estava fazendo, né? Não deu a atenção necessária, e precisou outra médica mais experiente aparecer, pra entender a gravidade da situação. Tudo isso poderia ser evitado, pelo que eu vi. Meu neto nasceu bonito, grande, normal, não é um bebê de 8 meses - é um bebê completo, de 9 meses, que eu vi. Três quilos e duzentos e cinquenta, isso não é peso de prematuro.”

UTI NEONATAL E O FONPLATA

Em 2017, a construção de uma UTI Neonatal estava nos planos originais do Fundo Financeiro para o Desenvolvimento da Bacia do Prata (FONPLATA), que garantiu R$ 40 milhões de dólares de investimentos em Corumbá (R$ 250 milhões de reais, atualizados e em cotação atual), mas o projeto foi abandonado pelo seu sucessor, Marcelo Aguilar Iunes (PSDB) - que transformou a maioria dos recursos do FONPLATA em “asfalto” assim que recebeu o dinheiro, já em sua gestão.

Segundo Ruiter Cunha - prefeito da época - declarou, em 12 de Abril de 2017, quando anunciaram a parceria da Prefeitura de Corumbá e o Governo do Estado, para o recebimento dos recursos do FONPLATA:

“A construção de uma UTI Neonatal, há tanto tempo sonhada, a tanto tempo precisando, para que a gente comece a salvar vidas, para que tenhamos condições mais qualificadas, mais aprimoradas para salvar nossos bebes. Isso é o que está acontecendo hoje aqui”, finalizou Ruiter.

A jovem mãe continua internada na UTI da Santa Casa de Corumbá, sedada e recebendo tratamento para conter a hemorragia e não perder seu aparelho reprodutor.

Comentários