Pantanal MS
21 de Novembro / 2024

Gestante "perdeu" vaga que havia saído na sexta-feira, às 2h da manhã. | Créditos: Facebook

  • Publicado em: 02 de Março, 2024 | Fonte: Fábio Marchi

Corumbá - O caos continua imperando em Corumbá e não há nada tão ruim, que não possa piorar na Cidade Branca: desta vez a gestante Eloise Carmen Marques de Arruda (29) com gravidez de risco (para ela e para o bebê, 7 meses de gravidez e perdendo fluidos uterinos) passou mal e deu entrada na Santa Casa de Corumbá na quinta-feira (29/02) - é o terceiro filho de Eloise.

Como o caso de Eloise é grave e por até hoje não ter UTI Neonatal na cidade, precisa ser transferida com urgência para Campo Grande.

O problema é que o NIR - Núcleo Interno e Regulação da Santa Casa comunicou a família que a vaga havia saído e que Eloise seria transferida às 2h da manhã, mas misteriosamente “perderam” essa vaga. Como diz Elen Marques, irmã de Eloise:

“Nós ficamos sabendo que já tinha vaga em Campo Grande, depois ficamos sabendo que não tinha ambulância. Aí vim aqui no hospital, aqui na maternidade, fiquei sabendo que tem ambulância, mas não tem a vaga. Então fica um diz que me diz, e a gente precisa de solução!”

Família confirmando que havia recebido a informação que Eloise havia conseguido a vaga para Sexta, 2h da madrugada. | Créditos: Reprodução / Facebook

A Secretária Adjunta de Saúde de Corumbá, Mariluce Leão, fazendo uma pergunta sobre a vaga em um post da família de Eloise, um dia após perder essa vaga no NIR. | Créditos: Reprodução / Facebook

Parente de Eloise, sobre as informações que receberam da Maternidade, que "não havia ambulância". | Créditos: Reprodução / Facebook

O ETERNO PROBLEMA DAS AMBULÂNCIAS DE CORUMBÁ

Embora a Prefeitura de Corumbá goste de dizer que não faltam ambulâncias, existe um grave problema de manutenção das mesmas - e até mesmo falta de pessoal especializado para ocupá-las. O MS Diário já recebeu denúncias de mecânicos que deixam de fazer manutenção nas ambulâncias para ganharem horas extras como motoristas e até supervisores do setor e que possuem deficiência visual (cego de um olho) para o transporte intermunicipal de passageiros, colocando em risco a vida dos seus ocupantes.

A manutenção das ambulâncias também é uma problemática constante: houveram semanas que as viaturas não possuíam nem sirene de alerta, com os veículos tendo que operar apenas com buzina, para abrir o trânsito - mesmo com a gerência do setor sabendo dos defeitos nas viaturas.

Portanto, segundo as informações que a família de Eloíse repassou ao MS Diário, é bem provável que quando abriu a vaga em Campo Grande, não havia ambulância disponível - e quando disponibilizou um veículo, a vaga havia sido perdida.

O MS Diário entrou em contato com a chefia do NIR - Núcleo Interno e Regulação da Santa Casa de Corumbá, mas recebemos a seguinte resposta:

“Olá Boa tarde 
Notas e  Comunicados a Imprensa somente com Diretor Técnico e o predidente da instituição.”

Recebida a resposta, entramos em contato com o Diretor Presidente da Junta Interventora da Santa Casa de Corumbá, que perguntou para nossa equipe de reportagem o nome da paciente, mas não deu uma devolutiva, até o fechamento desta matéria - que poderá ser atualizada no decorrer dos fatos.

A população de Corumbá começou uma iniciativa de petição online para a criação de uma UTI Neonatal em Corumbá | Créditos: Reprodução / Facebook

A UTI NEONATAL: A PROMESSA QUE NUNCA CHEGA

Embora anunciada há mais de 10 anos, a construção de uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI) neonatal para salvar a vida de bebês que nascem prematuros ou com outras complicações graves em Corumbá, nunca chegou a sair do papel e por isso, os moradores das cidades de Corumbá e Ladário enfrentam uma longa jornada em busca de atendimento para bebês, uma vez que nem mesmo na rede particular local há uma UTI neonatal disponível.

A promessa de construir essa unidade foi feita pelo ex-prefeito Ruiter Cunha, já falecido, que chegou a lançar uma licitação em 2013 para contratar uma empresa para realizar a obra. No entanto, o processo foi cancelado após pedido da procuradoria jurídica da Secretaria Municipal de Saúde, conforme publicação no Diário Oficial do Município.

Uma nova tentativa foi feita em 2016 e a verba saiu no final de 2017, quando a cidade estava prestes a receber um empréstimo de R$ 40 milhões do Fundo Financeiro Para o Desenvolvimento da Bacia do Prata (FONPLATA). Parte desses recursos seria destinada para melhorar o atendimento a bebês com quadros graves e uma UTI Neonatal estava nos planos originais do projeto idealizado.

MARCELO IUNES TIROU A UTI NEONATAL DO FONPLATA

No entanto, o atual prefeito de Corumbá, Marcelo Iunes, que assumiu após a morte de seu antecessor, afirma que a UTI Neonatal não foi incluída como projeto do Fonplata, nem consta como obra prevista em contrato. "Em momento algum foi feito um documento, alguma relação de que isso seria colocado como contrapartida", disse Marcelo Iunes em reportagem à um jornal campograndense. Porém, a matéria está no próprio site da Prefeitura de Corumbá, como vista no endereço deste link e no print abaixo:

Após assumir o cargo, Iunes “revisou” os planos de utilização dos recursos do FONPLATA, priorizando obras de infraestrutura urbana , especialmente asfalto de qualidade duvidosa, em detrimento de projetos na área de saúde. Isso resultou na ausência de investimentos na UTI neonatal ou em outras estruturas de saúde.

Em outra tentativa de proporcionar esperança à comunidade, o governo estadual de Mato Grosso do Sul anunciou que parte dos R$ 11,9 milhões repassados ao município em 2018 seria destinada à construção da UTI neonatal. No entanto, os registros do Portal da Transparência estadual indicam que esse dinheiro foi direcionado para outras obras na Santa Casa, incluindo a construção de um Pronto Socorro e a reforma da recepção e do centro obstétrico, que ainda está em andamento.

PREFEITO NÃO QUER GASTAR COM SAÚDE

Marcelo Iunes é um dos raros gestores do Estado que não quer a construção de um Hospital Regional na cidade - e já deixou bem claro isso em diversas entrevistas em rádios e podcasts.

Segundo Iunes, a construção de um Hospital Regional mantido pelo Estado em Corumbá inviabilizaria a existência da Santa Casa - que hoje é mantida com recursos estaduais, federais e municipais - e joga a culpa no Governo do Estado, dizendo que “a UTI Neonatal não existe, porque não existe contrapartida do Estado”.

Segundo o prefeito tucano, uma UTI neonatal custaria, em média, R$ 400 mil por mês - mas Marcelo Iunes não economiza na folha de pagamento dos funcionários comissionados no Executivo, que segundo ele próprio “dobrou a folha de pagamento da Prefeitura” para R$ 28 milhões mensais, “porque isso seria benéfico para o comércio local”. Confira o vídeo abaixo:

ALERTA VERMELHO PARA O PRÉ-NATAL DE CORUMBÁ

O MS Diário conversou com alguns médicos das áreas pediátrica e obstétrica (que não quiseram se identificar, por temer represálias) e que segundo suas observações profissionais, provavelmente estão ocorrendo falhas nos pré-natais da rede pública municipal.

Citam por exemplo, “data marcada” nos postos de saúde de Corumbá para cadastro de gestantes no sistema:

“Quando uma mãe descobre que está grávida e chega em um posto de saúde para fazer seu cadastro, ela é impedida pelos funcionários, pois “existe uma data específica na semana para isso”. Muitas mães trabalham ou tem vários afazeres que impedem ela de retornar na data marcada - e assim, exames importantes deixam de ser realizados.” - disse um(a) médico(a).

Outro(a) médico(a) também relata o déficit de profissionais para gestações de alto risco e da falta de treinamento dos médicos novos que ingressam no sistema de saúde municipal:

“Existem apenas dois profissionais cadastrados no sistema de saúde municipal e mesmo assim, não estão presentes 100% na cidade, um deles inclusive bate ponto boa parte da semana em Terenos - com post na rede social e tudo. Como atender uma população como a de Corumbá com apenas dois médicos?

E depois tem a questão do treinamento, tem muito médico e médica que chega aqui “cru”, não sabem nem intubar um paciente, são inexperientes e tremem na base quando vêem uma situação de risco - e acabam ficando dependentes de um profissional mais antigo, experiente. Esse profissional mais antigo acaba se desgastando, também - porque acaba tendo que fazer o trabalho dos novatos e novatas, além do seu próprio trabalho.

Então esse pessoal novo não sabe identificar uma gravidez de risco, não está olhando para o histórico de uma mãe que já perdeu um, dois bebês. O que está acontecendo? Qual problema precisa ser resolvido para aquela mãe ter um bebê? O pré-natal evita uma série de problemas que só vão aparecer na hora do nascimento, quando geralmente não tem mais conserto, não dá mais para remediar”. 
 

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